A minha relação com Zack Snyder: o que vi neste Justice League?

Demorei mais que o habitual a escrever sobre este tema. Por uma razão muito simples: o Snyder Cut tem muito que se lhe diga e é uma tema de conversa que vai muito para além das 4 horas de filme. E antes de aprofundar o assunto, digo já: este cut É um filme de Zack Snyder, com tudo aquilo que de bom, e também de mau, isso acarreta.

O filme não parece ter a duração que tem, dado ao seu pacing brilhante que faz o tempo passar rapidamente. Rapidamente notamos a diferença de tom em relação à versão de Joss Wheadon graças à incrível banda sonora composta por Tom Holkenborg (que já congratulei diversas vezes aqui neste espaço). Tom abordou-a de forma que fosse complementar com o que vimos, e ouvimos, nos outros filmes da DC desde Man of Steel, com o regresso de temas como Flight e Is She With You? - um problema que tive com a composição de Danny Elfman que teve medo, ou foi impedido, de usar os temas compostos previamente por Hans Zimmer. Ao longo do filme também ouvimos repetidamente variações dos mesmos temas que se adequam perfeitamente à cena em que inserem, como o tema das Amazonas que se interliga com o de Wonder Woman. Este tom mais sério e cru identifica-se com esta abordagem da DC às suas personagens, que se apresenta como antagónico ao colorido que vemos nos filmes da Marvel. Esta banda sonora é um autêntico mastodonte que Tom Holkenborg agarrou com unhas e dentes e criou uma autêntica obra-prima dentro do género.




Zack Snyder's Justice League é mais que uma série de cenas novas que tinham ficado na sala de edição. É um filme que, apesar de seguir as linhas gerais do que vimos no cinema, apresenta a mesma de um modo completamente diferente. Claro que, para o conseguir de forma consistente, precisa dessas 4 horas de duração especialmente porque Snyder levou o seu tempo a desenvolver as personagens e a preparar todos os subplots que existem. É aqui que chegamos a Ray Fisher e à sua magnífica interpretação de Victor Stone/Cyborg. Zack Snyder não se limita a dar um arco à Victor Stone, dá-lhe o MELHOR arco do filme. Se no original (e por original quero dizer o que esteve no cinema em 2017) Cyborg é quase um figurante em grande parte do filme aqui é a força motriz para a equipa resolver o conflito em que se insere. Desde a constante ausência do pai, Silas, à morte da mãe e o desespero de Silas em impedir que o filho morra ligando-o a uma motherbox: nasce Cyborg, mais homem que máquina. Ray Fisher é, na minha opinião, a estrela maior do filme e o actor que sobressalta à vista de entre todos. Depois temos Ezra Miller, que interpreta Barry Allen/Flash, que tal como Ray foi quase um figurante no original servindo praticamente apenas como bobo da corte. Barry tem também um arco neste Justice League. Embora não vejamos como é que ele ganha os seus poderes vemos finalmente como é que ele se adapta a eles e o que o motiva. Começo por estes dois porque foram absolutamente destruídos no original e ganham vida com Zack Snyder. As 4 horas de filme ajudam imenso...


Os vilões, também eles, sofreram uma mudança radical. Steppenwolf , no original, existe apenas para fazer o plot andar para a frente. Nunca temos a sensação que é um vilão com motivos, nunca percebemos o porquê de ele agir como age. Zack Snyder, mais uma vez, apresenta uma versão enriquecedora. Na sua versão faz com que Steppenwolf (interpretado por Ciaran Hinds) tenha um motivo forte (não ao nível de outros vilões que já vimos nos ecrãs naturalmente), e percebemos que as suas acções são mais que meros caprichos, são uma missão pessoal. Uma missão de redenção perante Darkseid (que também ele foi deixado na sala de edição em 2017). Ray Porter tem poucos minutos de ecrã, em comparação com outros, mas consegue com a sua interpretação dar um ar imponente a Darkseid (o CGI ajudou, naturalmente). As 4 horas realmente fazem maravilhas a este filme...

Em relação aos restantes actores todos eles seguem aquilo que fizeram em 2017, melhorados em alguns aspectos mas pouco há a salientar. A direccção de Zack Snyder melhorou imenso a interpretação de Gal Gadot como Diana Prince/Wonder Woman e há uma cena no final que se nota claramente que é um reshot com Ben Affleck (em que está nitidamente mais envelhecido e muito mais magro). Pouco mais há a salientar sem entrar em spoilers, que estou a evitar.


Fica também a ressalva à prestação de Jeremy Irons como Alfred Pennyworth, absolutamente fantástica como já é habitual neste senhor. Henry Cavill regressa como Clark Kent/Kal-El/Superman, Jason Momoa como Arthur Curry/Aquaman, Amy Adams como Lois Lane. O elenco, no fundo, é o mesmo que já vimos noutros filmes da DC... No final posso também dizer que Jared Leto se redime como Joker neste filme depois do desastre que foi Suicide Squad.


Como muitos saberão eu sou apreciador de Zack Snyder, desde que ele realizou 300 que sigo o seu trabalho com atenção. Gosto da atenção que Snyder tem ao detalhe, a sua abordagem ao world building nos seus filmes e a capacidade que tem em criar filmes visualmente brilhantes. Não é à toa que dizem que Zack Snyder é style over substance, uma crítica da qual não discordo totalmente. No início disse que ser um filme de Zack Snyder acarretava coisas boas, que já referi, mas também más - que vão ser referidas agora... Snyder tem por hábito usar e abusar de slow motion, o que eu gosto. Mas num filme de quatro horas é demasiado.

Outra questão é o diálogo, que parecer ser recorrente em trabalhos de Zack Snyder. Apesar de esforçado e melhor que o habitual parece não atingir a marca em alguns momentos. Neste ponto, no entanto, é desculpável dado que diálogo é difícil de escrever. Até Christopher Nolan tem dificuldades em alguns momentos. Nem todos podem ser Quentin Tarantino... *wink wink*.

No cômputo geral é claramente um dos melhores trabalhos de Zack Snyder, atrás de 300 e de Man of Steel, diria. Um momento de redenção para si, e finalmente a oportunidade de ultrapassar a morte da filha, como vemos num dos últimos frames do filme:

"For Autumn."

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