TENET - ou quando o tempo volta mesmo para trás...

Se leram o último post certamente repararam que se tratava de um jogo. Poderiam pensar vocês, leitores, "então mas estes parolos não era sobre filmes que escreviam?!"... Sim, é. Mas o nosso amor por videojogos acaba por trazê-los a este espaço. E o que não falta por aí são jogos com histórias fantásticas, melhores que muitos filmes e séries. Como tal poderão vir a ler mais reviews de jogos aqui.


Posto isto, passemos ao novo tópico para esta semana. Um filme que demorou semanas, meses até, a fazer sentido na minha cabeça. Mas vamos por partes...


Tenet não é apenas o décimo filme de Christopher Nolan. É talvez o mais experimental da sua carreira, e o mais ambicioso também. O tema explorado não é diferente dos outros como Inception, Interstellar e até Dunkirk. A importância do tempo, a sua relatividade e a impotência humana em combater a sua passagem. É difícil, neste caso específico, fazer uma análise do filme sem analisar o seu plot e sem dar grandes spoilers. Nolan é conhecido pela sua construcção de personagens e pela forma como consegue fazer a audiência identificar-se com quem está no ecrã, mesmo que não consiga entender com facilidade, e à primeira, a mensagem que está a ser transmitida.


Mas regressemos ao tema central antes de entrarmos nas personagens propriamente ditas. Em Inception, Nolan aborda a forma como o tempo passa durante os sonhos, em Interstellar tenta fazer uma exposição da sua relatividade entre a Terra e o espaço. Em Dunkirk, coloca a Segunda Guerra Mundial como plano de fundo num estudo sobre como várias linhas temporais podem cruzar-se entre si e salvar milhares de vidas. Tenet insere um conceito novo, o tempo torna-se invertido. Começamos a regredir no tempo em vez de progredir. No futuro, a humanidade tenta fazer o tempo voltar para trás para poder mudar tudo e tornar o mundo um lugar melhor, reescrevendo os erros que todas as gerações cometeram até aqui. Um conceito interessantíssimo no papel, e eu confesso que estive meses impaciente para poder ver o filme. O facto de eu ser fã incondicional de Christopher Nolan ajudou imenso a isto, naturalmente.


O colapso da União Soviética marca o ponto de contacto entre o futuro e o presente e é aí que, nos últimos 30 anos, o nosso vilão de serviço, Andrei Sator, se torna um dos homens mais poderosos do mundo, utilizando os conhecimentos que recebe do futuro. Sator, interpretado por Sir Kenneth Brannagh (Dunkirk), infelizmente não é um vilão memorável e parece sempre um pouco bidimensional e medíocre quando comparado com outros antagonistas de Christopher Nolan.


As outras personagens, felizmente, são diferentes e muito mais bem construídas. Desde Neil, interpretado por Robert Pattinson (The Lighthouse), a Katherine, interpretada por Elizabeth Debicki (The Man From U.N.C.L.E.). Pattinson especialmente sobressai. O actor inglês continua a surpreender tudo e todos com a maneira como se conseguiu reinventar depois de Twilight. Estou mais que pronto para o ver em The Batman! Neil é o handler do protagonista, e como vimos a descobrir um dos melhores amigos do mesmo. É através dele que grande parte do plot se desenrola. Katherine também é importante na trama por ser a esposa de Sator, e é através dela que o nosso protagonista ganha acesso ao oligarca russo. Estas duas pessoas vão guiar as acções do protagonista enquanto este tenta desenrolar todas as linhas temporais.


Neste último parágrafo introduzi a personagem de John David Washington (BlackKklansman) como "protagonista". É isso mesmo que ele é, o protagonista. Sem nome, apenas protagonista. Washington interpreta um agente da CIA que é "morto"  após uma missão falhada na Ucrânia (abertura do filme, já lá vamos). O filme sofreu imensas críticas nesse campo, a forma como o protagonista não tem um nome nem motivo para tomar as acções que toma. Não tem background. O que é estranho para Christopher Nolan (lembram-se quando eu disse que era o filme mais experimental dele?). Se, por um lado, consigo perceber estas críticas e até certo ponto concordar com as mesmas...por outro lado... Tenho que discordar também. Foi uma decisão ousada e um risco enorme. E de certa maneira foi um risco que não compensou dado que muitos consideram Tenet um falhanço. Mas eu não vejo assim... Christopher Nolan tem, para mim, um percurso que lhe permite tomar estas decisões e falhar sem sofrer repercussões. Está num grupo restrito onde eu incluo Scorcese, Tarantino, Coppola e outra meia dúzia de realizadores. Christopher Nolan não é um realizador que se deixa descansar à sombra da bananeira e repete várias vezes a fórmula que lhe trouxe sucesso, cada filme dele é claramente Nolan-esco, mas são tão diferentes entre si. Batman Begins e Interstellar são dois filmes completamente diferentes, tal como Memento e Tenet também o são. Ainda assim todos eles têm o dedo claro de Christopher Nolan.


Claro que isto é tudo uma mera opinião. E não podemos dizer que o protagonista ter sido escrito desta forma não tem uma motivação, que tem e muito clara. O personagem de Washington, aos olhos do mundo, morre depois da missão falhada na Ucrânia. O seu próprio superior o diz: "You're dead." A partir deste momento o protagonista passa a ter um dever que transcende as nossas noções corriqueiras de nação, Tenet *roll credits* afecta tudo e todos. Daí o filme passar-se em vários locais do mundo: Ucrânia, Vietname, Londres, Oslo, Talinn, Sibéria... Todos estes locais estão interligados pelos tecidos temporais que Tenet explora. O protagonista está no centro de tudo. O protagonista do futuro é o líder da Tenet e recrutou o seu eu do presente para impedir Sator de destruir a realidade em que vivemos. Confuso? O filme tem esse propósito, não se sintam mal.


A meio de tudo isto já quase me esquecia de algo essencial... A música. A banda sonora de Tenet é fenomenal. Ludwig Göransson (sim, o mesmo que compôs a banda sonora para The Mandalorian) é um absoluto génio e um dos meus preferidos para "substituir" Hans Zimmer. A banda sonora, para mim, é tão boa que não sei se não virá a ter direito a um texto específico para ela... Vou reflectir sobre o assunto.


Tenet não rompe necessariamente com o passado de Christopher Nolan, dá-lhe continuidade. Mas de uma forma que ao mesmo tempo lança as bases para o seu futuro. Espero sinceramente que o realizador não me faça engolir o que escrevi e não descanse a sombra da bananeira. E continue a inspirar os cinéfilos do futuro.


Tenet está disponível em DVD, Blu-Ray e Ultra-HD DVD. E tem, sem dúvida, o meu selo de aprovação. 

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